terça-feira, 8 de maio de 2012

Esta é uma crónica de costumes. Bons e maus. Mas nela espreita o que me tem feito mover ultimamente, o projecto a que eu decidi chamar, para já, "love is a strange place" (de uma vez por todas, o titulo está em inglês, porque o projecto pretende ter divulgação lá fora i.e. para lá da fronteira com nuestros hermanos e com o mar aqui tão perto, e como a linguagem das imagens é internacional, permanecia a questão do titulo..). Basta de divagações. Ponto 1 da agenda: Pingo-Doce, ou o triunfo da barbárie. Antes de ser atacado pela intelectualidade bem pensante, como argumentos como "parece que são ricos (ou finos) demais para estas coisas", ou "parvalhões armados em bons, eu cá enchi a despensa", ou conparações bacocas com as filas para o hi Phone, entre outras preciosidades, recordo os numeros e os factos: dezenas de feridos, com um caso particularmente grave de uma senhora, com uma criança de 3 anos ao colo, pontapeada até necessitar de intervenção cirurgica à coluna (ressalvo que das dezenas de pessoas presentes no local, ninguem interviu..), por um bando de energúmenos, numa discussão por....um carrinho de super-mercado. Outros carrinhos açambarcados e depois vendidos pela melhor oferta. Discussões com um nível capaz de fazer corar um indio de pau, agressões, esticões, insultos, empurrões, enfim, a humanidade no seu melhor, a fazer lembrar, a um nível lusitano claro está, os tristes acontecimentos dos motins em Londres. Aproveito para relembrar que não se tratava de um estado de calamidade, guerra, cataclismo, ou desgraça iminente, em que a necessidade de sobrevivência supera todas as coisas, mas de uma merdice de uma campanha de vendas, promovida por um gigante da merceearia nacional. Eu já assisti a saques a sério. Em 2003, no Iraque, depois de a autoridades iraquianas desaparecerem do mapa, e as americanas ainda não terem aparecido nele, houve um vazio que durou alguns dias. Nesse vazio valeu tudo, até o saque do Museu Nacional de Bagdad, que tanto brado deu nos media de todo o mundo. Eu lembro-me de gente nas ruas, apinhada com os objectos mais estapafúrdios e improváveis, só porque podiam traze-los de onde estavam sem consequências. É em situações limite que se revela o melhor, mas também o pior, de nós. Não que a estratégia de marketing do Pingo-Doce seja uma situação limite, mas se um dia formos assolados por uma, o mote está dado. Às vezes penso, olhando para o panorama politico e económico do País, que nós (os portugueses) apenas temos aquilo que merecemos. Séculos de império, de possibilidades, de desbravamentos, para acabarmos à estalada por uma lata de atum. Enfim.
Em tempos como estes, tendo a perder a fé na espécie humana. A achar que não merecemos nada, talvez nem existir. Que não passamos de uns bichos, piores que bichos, que à minima possibilidade revelam o podre que têm lá dentro. Mas depois sei que não é bem assim, que há Pessoas (assim com P grande), que relançam a esperança. Esperança no futuro, onde mora o meu filho. Pessoas como a Lucília, a mãe do pedro, um menino autista, de 17 anos. A Lucília não desiste, não esmorece, mesmo quando as lágrimas lhe apertam o peito, de ser o amparo, o resguardo, a força do filho, para quem o mundo é um lugar estranho  - é amor afinal, a maior das forças não é verdade. contra ele, não há barbárie que resista. E assim, como pessoas como a Lucília, e outras que eu vou encontrando neste percurso, que escolhi testemunhar e contar, a luz vencerá. Obrigado Lucília por me lembrares que o forte não é o que rouba ao fraco, é o que o protege. E assim a minha fé permanece.

  A humanidade já passou por muitas ameaças - não poucas das quais, iguais à que enfrentamos hoje. Epidemias e pandemias são recorrentes na ...