quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Filho meu, és tudo para mim. Tudo. Hoje o teu pai sufocou lágrimas com fotografias, porque o planeta não pára de girar e as notícias têm que sair. A ti para quem eu desejo tudo, temo só te deixar um mundo sem solução, sem remédio, sem esperança. Já sonhei em muda-lo, já fui ao inferno e voltei, apenas para perceber que o inferno é aqui, junto a nós, onde o Homem estiver.
Hoje duas crianças, dois bebés, como tu, morreram, sufocados, num quarto miserável, numa aldeola perdida, no meio de nenhures, assassinados por quem mais os devia amar, pela mãe que os deu ao mundo, que era suposto protege-los com a vida mas que afinal os privou dela.
Desculpa meu filho, a herança que te deixo, um mundo onde a compaixão é um sonho ao alcance de poucos e onde a bondade é confundida com fraqueza. Eu não desisto, acredita que não, continuarei a bater-me até que a terra me coma, mesmo que todos os moinhos de vento se levantem contra mim, porque a ti meu filho, a todos os inocentes como tu faço o juramento solene de essa ser a missão da minha vida. Mesmo que às vezes só me apeteça desistir, encolher os ombros, ir para onde não haja mães que matam os filhos, seja porque razão for, porque não há, não pode haver razões que o justifiquem. Mas depois percebo que não há sitios assim. Porque o inferno é aqui, onde o Homem estiver.
Em Gaza mata-se pela terra, no Afeganistão pela religião, no Iraque pelo petróleo, em todo o lado pelo ódio. Que Deus é este, omnipotente dizem, que permite tais coisas. Ali, frente áquele quarto enegrecido, debulhado pelo fumo e pelas chamas, naquela cama de bebé, quase igual à tua, duas almas partiram sem saber como nem porquê, inocentes das causas dos adultos. Ali, frente áquele quadro de Dante, o meu coração torceu-se e chorou, e eu sufoquei as lágrimas com fotos e interrogações com imagens. Não adianta fugir, o ódio não tem pátria nem fronteira. desculpa meu filho, o mundo que te deixo.
Sabes, quando escrevo estas linhas, as palavras brotam do meu peito como de uma ferida aberta, e não páro de pensar em ti e na maneira como me olhas e me amas e me apertas e sei, sei-o cá dentro bem fundo, que o mal e o bem existem e que cedo ou tarde todos teremos que escolher um lado. E mesmo com sacrificios, mesmo com dor, mesmo sem esperança, continuarei a acreditar. Mesmo sózinho. Por ti. Por eles que não tiveram quem os defendesse. Por todos nós. Porque o mundo só acabará de facto quando nos rendermos e essa causa vale bem a minha vida. Para que um dia tenhas orgulho em mim.

 

6 comentários:

  1. sem comentários mesmo. :-*
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  2. lindo....chorei a ler...és grande...bj Paula (ibal)

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  3. Angelo, ao ler o que escreveste comovi-me e desejei que o dia tivesse voltado atrás....... o nosso filho terá sempre orgulho em ti, pelo pai e homem que és. Eu e Tu temos uma missão - fazer dele um Grande Homem! Seremos as asas dele até ele conseguir voar ...Um beijo

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  4. Eu já tenho muito orgulho em ti, sempre que te leio e sinto as palavras que saem do teu coração e é tão bom poder seguir este caminho de perto... Digo-te o que me disseram a mim há dias e que não me sai da cabeça, "-Não esperes nada da raça humana... Sê Livre, Sê Tu... Mas não esperes nada..." digo-te o mesmo <3

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  5. A esperança do mundo está aqui! Nisto. Assim, tal e qual. No Amor que nos une uns aos outros, seja ele de que tipo for. É por tudo isto existir que sei que nada, nada ainda se perdeu por completo. :)

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  6. Obrigado a todos pelas vossas palavras. É para vós que escrevo e fotografo e luto. Sempre.

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